segunda-feira, 5 de outubro de 2009

O prazer da leitura

Entrar numa biblioteca e escolher um bom livro, na maior parte das vezes é uma tarefa fácil. Basta agarrar num daqueles que esteja mais manuseado, mais sujo e normalmente com a lombada a descolar, é sinal de que foi muitas vezes lido e que a sua fama passa de boca em boca. No entanto, por vezes tento saber mais dos autores portugueses e por norma eles apesar de narrarem boas histórias, desiludem pela forma enfadonha e complicada como são escritos, fazendo lembrar a maioria dos filmes portugueses que para aí se fazem. Ultimamente apostei em tomar conhecimento da Agustina Bessa-Luís (O Comum dos Mortais), do Vitorino Nemésio (Mau Tempo no Canal) e do José Cardoso Pires (Delfim), sendo que deste último já tinha lido Balada da Praia dos Cães. Como atrás disse, as histórias são boas só que a forma de serem contadas não me empolgam e por vezes faz-se da leitura um esforço para que não se perca o fio à meada. Para não perder a fé no prazer da boa leitura, tenho que de seguida ler um autor consagrado, que foi o que fiz após a história do Manzarino uma metáfora ao Salazar e ao Estado Novo nesse bom romance da Agustina. Então, o livro que sofregamente pego, tal como quem vai à janela respirar ar puro, foi o Toque de Midas da australiana Colleen McCullough. Uma narrativa extraordinária a atravessar várias épocas, não ficando de modo algum atrás dos Pássaros Feridos.
Nesta incursão pelos autores portugueses às vezes surgem agradáveis surpresas e uma delas foi Sinais de Fogo de Jorge de Sena que a maior parte das pessoas já ouviram falar e poucas leram. Até porque Sinais de Fogo é um nome sonante e que na memória fica gravado a… fogo. Um livro com um tamanho razoável e letra miúda quase parecendo um pequeno dicionário e cuja história inacabada (no final fiquei com essa sensação) é passada na Figueira da Foz no tempo da guerra civil espanhola e do nosso regime a assobiar para o ar como nada se passasse, à espera para que lado cai o poder, mas sempre dando sorrateiramente uma facada nos antifascistas. Mas a parte curiosa do livro e principalmente para a época em que foi escrito, é o tratamento dado às cenas de cariz sexual. O leitor é levado com o par de apaixonados ao encontro de uma casa escondida que aluga quartos para o efeito e onde eles misturam o seu amor puro no leito de um quarto asqueroso onde tantos outros fazem a descarga de instintos unicamente animalescos. Ou de outra personagem que é um machão a ganhar dinheiro com homosexuais ou mesmo metido com uma velha rica também para sacar dinheiro. Assim como no Mau Tempo no Canal eu fui levado aos Açores e senti-me um ilhéu, o mesmo aconteceu com este de Sena, a fazer-me pisar as areias da Figueira.
Também a leitura de A Filha do Capitão, romance de José Rodrigues dos Santos é inolvidável. Uma história de amor passada em plena primeira grande guerra mundial onde o autor bem realça o massacre sofrido pelas tropas portuguesas e o leitor é introduzido nas trincheiras parecendo sentir um cheiro podre, a pólvora a… morte. Tal como Miguel Sousa Tavares também José Rodrigues tem uma escrita na linha de Eça, aquele género de escrita poderosa que entusiasma o leitor parecendo que até nas entrelinhas escrevem.
Aqueles livros que os amigos nos cedem por empréstimo, por norma também são dos melhores e foi o que ultimamente me aconteceu ao devorar A Sombra do Vento do autor espanhol Carlos Ruiz Zafón. Mais um romance espectacular que tem a particularidade de nos transportar a Barcelona aos tempos do fascismo de Franco e à guerra fratricida onde o autor com grande mestria, faz coincidir a história de amor do personagem principal com a de um livro que este anteriormente leu.
Bons livros estes, que são uma alternativa ao pequeno ecrã nas noites mais longas que se aproximam.

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